Janela Indiscreta

Blogue recomendado por Pedro Rolo Duarte no seu programa Janela Indiscreta, da Antena 1, a 28-07-2010.

7 de novembro de 2010

34º Episódio

Suspirei conformado, mas pedi ainda:
“Só mais um favor, Sr. Cebolo: deixe-me falar uma última vez com a Olga!”
“Impossível. A nenhum preso é permitido receber visitas.”
“Peço-lhe, em nome da nossa amizade! Sabe, é que ela na Sala da Presidência lançou-me um olhar tão angustiado, que não me sai da cabeça.”
“Mas não foi por saber que ia ser executada. A Olga não teme a morte.”
“Então porque foi?”
Ele suspirou:
“Por causa da maneira com que o senhor implorou pela vida da Dra. Luninski.”
“O quê? Tem a certeza?”
O Sr. Cebolo não respondeu. Depois de uma curta reflexão, disse:
“Vou abrir uma excepção e levá-lo à presença da Olga. Sinto vontade de dar uma última alegria à rapariga.”

A Olga dividia uma cela com a Sra. Relot, pelo que tive que tolerar todo o tempo aquele olhar idiota através dos óculos quadrados pousado em nós.
Não sei se era a força das circunstâncias, ou por eu estar mais sensível à sua pessoa, o certo é que a russa se me apresentava sob um ponto de vista totalmente diferente. Tinha os cabelos soltos pelos ombros e a severidade desaparecera do seu rosto, dando lugar a um olhar melancólico, mas inteligente. Apercebi-me de que ela era dotada de uma beleza e de uma dignidade especiais. Tornei a pensar nos filmes antigos que tinha visto em casa do meu colega, pois a Olga fazia-me lembrar a protagonista de um filme noir, assim uma... Lauren Bacall. E também me fez lembrar que eu preferia as louras, antes de me apaixonar pela Chanel.
Ela sorriu:
“Sempre veio, Professor.”
Agora, até a sua voz rouca se me soava sensual. Peguei-lhe nas mãos e os seus olhos castanho-claros brilharam.
“Admiro a sua coragem, Olga. Você mais parece uma diva do que uma mulher condenada à morte.”
“Só para ouvi-lo dizer isso, já valeu a pena vir parar a esta cela.”
“Eu... sinto-me em parte responsável pela situação. Sinto muito...”
“Não, Professor. O senhor trabalhou para nós e fez um serviço excepcional: devolveu-nos o nosso Führer.”
“Sim”, piou a Sra. Relot e eu estremeci, pois tinha-me esquecido dela. “Morremos para salvar o mundo! Nunca mais ninguém falará de Cristo!”
Meu Deus, que mais absurdos eu teria ainda que ouvir? Fixei de novo a minha atenção na Olga:
“O Sr. Cebolo disse-me que você não temia a morte.”
Ela suspirou:
“Há anos que ando cansada desta vida, só me trouxe tristezas e desilusões... Foi por isso que me liguei a esta comunidade. Mas quem verdadeiramente deu um novo sentido à minha vida, foi o senhor, Professor.”
“Eu?!”
“Sim... e no entanto...” Largou as minhas mãos, sentou-se sobre a sua cama e exalou: “Nunca me mandou chamar.”
“Chamar?”
“Logo no primeiro dia lhe disse que me podia chamar a qualquer hora, se precisasse de mim. Sabe, nós, os seus raptores, tínhamo-lo observado dias a fio. E eu acabei por não resistir ao seu charme...”
“Oh!” Sentei-me ao lado dela. “Naquela altura eu estava confuso demais para me aperceber de uma coisa dessas.”

6 comentários:

jota disse...

Ora isto está a levar mais um volta. Será que vamos ter um síndroma de Estocolmo distorcido?

antonio ganhão disse...

As mulheres deviam servir os maridos como estas servem o seu Fuhrer, com inquestionável dedicação...

Cristina Torrão disse...

Que engraçadinho, implume!!!

Rafeiro Perfumado disse...

À beira da morte e pensa no charme do professor? Jazus...

Daniel Santos disse...

o nosso herói está com tudo.

Zé Povinho disse...

Um herói pouco atento aos sinais e agora dividido nos sentimentos.
Abraço do Zé